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sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Um surdo, professor de dança?

"Cada surdo tem a sua maneira de aprender, esta foi a minha"

Cláudio Magalhães, 39 anos, é professor de dança de salão. Não seria nada demais se, além da habilidade para dançar, ele não tivesse, também, uma deficiência auditiva que o impede de ouvir quase que completamente. A surdez começou aos seis anos. Os motivos não passam de especulação. Certo mesmo é que ele se apaixonou pelos sons e, claro, pela música - desde que começou a usar o aparelho auditivo. Quando as pessoas sabem que ele é surdo e dança, acham graça, chegam até a duvidar. Mas ele não perde o rebolado e nem a auto-estima. Essas e outras histórias da vida de Cláudio, vocês lêem abaixo, neste pingue-pongue.

Qual a causa da sua deficiência e em que grau?Eu perdi a audição parcialmente. Sou surdo em um ouvido e, no outro, consigo escutar muito baixo sem o aparelho. Os médicos não souberam descobrir a causa da perda auditiva. Eu era bem pequeno, tinha uns seis anos de idade. Os médicos acharam que foi alguma virose que peguei quando ainda estava na barriga da minha mãe. E nessa idade já falava muita coisa, por isso não me prejudicou muito. Estudei em colégio comum, não sei libras (linguagem dos sinais), falo normalmente, mas parece que tenho sotaque estrangeiro. Ninguém percebe que sou deficiente auditivo na rua, todo mundo pensa que sou estrangeiro.

Como é a música para você?Música sempre foi uma paixão desde criança, a partir do momento em que comecei a usar o aparelho. Apaixonei-me pelos sons, pela música. Todo mundo sente vibrações dos sons independentemente de ser surdo ou não.

E a dança?No meu caso, consegui aprender a dançar, porque sempre tive facilidade, talento para isso mesmo. Nas aulas, eu prestava atenção em tudo, acompanhava as pessoas ao mesmo tempo em que prestava atenção na música para entrar no ritmo. Acredito que cada surdo tem a sua maneira de aprender, e esta foi a minha.

Como começou a dança de salão? Comecei a me interessar pela dança de salão tarde, porque achava que era coisa de velho, como todo jovem. Até que, há uns 15 anos, assisti um grupo de adolescentes de 11 a 17 anos dançando. Vi que não tem nada a ver com os velhinhos dançando. Empolguei-me, entrei por impulso mesmo. Lembro-me que morria de vergonha. Eu dançava no final da sala. A dança ajuda a perder a timidez. Apaixonei-me e resolvi me dedicar com o intuito de me tornar profissional. Posso dizer que foi uma das melhores coisas que fiz. Isso me faz muito feliz. Sempre achei bonito todos os tipos de dança. Ainda vou aprender outras modalidades.

Alguma vez, enquanto estava dançando, passou pela sua cabeça a sua condição de estar ali fazendo uma coisa que para muitos pode parecer contraditório?Nunca pensei nisso, mas reparei algumas reações das pessoas. Quando me vêem dançando, elas ficam surpresas, acham que surdos não conseguem dançar. Quando alguém conta para outra pessoa que eu sei dançar muito bem, as pessoas riem, acham graça, muitos só acreditam quando me vêem dançando.

Qual seu sentimento em relação à surdez?Nos tempos de colégio, sofremos muito mais preconceito. Há sempre crianças e adolescentes debochando. Com o tempo, amadureci. Hoje em dia, não me incomoda mais nada, não tenho vergonha nenhuma e enfrentaria as pessoas se fosse preciso. Tenho até orgulho. Afinal, consegui provar que mesmo sendo surdo, posso dançar muito bem. Tornei-me profissional, apesar de ainda não ter conseguido o meu espaço e ser respeitado por isso. Infelizmente, as pessoas valorizam o que está na mídia, na TV. Um rapaz bonito pode dançar mal, mas se aparecer na televisão, todo mundo estende o tapete para ele passar. As pessoas não valorizam quem tem talento de verdade e luta para conquistar o seu espaço. Assista ao vídeo de Cláudio Magalhães em ação.

(Fonte: http://www.sidneyrezende.com/noticia/9047+cada+surdo+tem+a+sua+maneira+de+aprender+esta+foi+a+minha)

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